segunda-feira, 25 de março de 2019

Estudos sobre Anne Frank – Parte 2: Minha leitura do Diário



Eu comecei a ler o Diário de Anne Frank pela primeira vez há alguns anos. Fiz como fazia com qualquer outra leitura, em cada momento que parava para ler, eu seguia até onde meu interesse parava, o tempo acabava ou o sono chegava. E estranhamente para mim a primeira opção é a que se tornou frequente para interromper minha leitura.

Parei de ler por um bom tempo, mas não parei de me questionar o motivo desse desinteresse. Talvez desinteresse não seja a melhor palavra para explicar o que acontecia, mas é a única que tenho agora. Então eu pensei em como aquele diário foi escrito. E passei a ler uma entrada por dia. Ou melhor, por noite. Fiz isso durante meses e houve momentos em que quis prosseguir adiante, lendo mais do que o combinado, mas não o fiz naquele momento. Minha conexão com Anne e suas palavras começaram quando senti o peso desse tempo de confinação. Não foi uma escrita planejada. Foi uma escrita guiada pela vida, por suas percepções e suas condições.

O começo é leve e bem cotidiano. Apesar de já viver sob o regime ditador da Alemanha, Anne foca naquilo que lhe diverte e interessa. Conforme os dias vão passando aumentam as restrições, até que ela se encontra em isolamento com sua família e os Van Pels.  E começam as pequenas brigas por espaço, por atitudes, por comida, enfim, tudo o que se espera de um grupo como esse em confinamento. E mais além, até cheguei a me assustar como me identifiquei com seus pensamentos e até modo de escrever. Uma familiaridade que ainda não sei explicar.

Observando o que Anne descreve, vamos notando seu amadurecimento como escritora. Há vários trechos adicionados posteriormente, quando ela decide que vai publicar seu diário quando a guerra terminar. É nessa reescrita que fica mais claro sua preocupação com forma, conteúdo e estilo. O seu amadurecimento como pessoa caminha junto com esse desenvolvimento como grande escritora.

O diário era sua válvula de escape, seu melhor amigo, seu motivo para seguir resistindo no cansativo enclausuramento. Há mais dias ruins, alguns bons. Sua relações com as pessoas mudam. Sua mãe lhe parece a inimiga número 1 em dado momento, em outro alguém que está tentando fazer o melhor. Peter, o filho do outro casal que também se abriga com eles, passa de garoto bobo e desinteressante para um grande amor em sua vida. Somente seu pai deixava a mesma impressão constante durante todo o tempo.

Mas antes de chegar nesse ponto, quando as coisas mudam de fato, eu havia parado com a leitura. Me mudei de país, sem saber quando, e se iria voltar, me foquei em outras coisas e li o diário com menos frequência.

Foi então que decidi voltar ao Brasil. Depois de ficar 5 meses e algumas semanas na Irlanda eu percebi que lá não era mais o meu lugar. Comecei os preparativos para o retorno e fui checar a passagem de volta. Era para o dia 3 de setembro de 2017. Havia uma parada em Amsterdã de 23 horas. Eu vi ali então uma oportunidade que talvez nunca mais teria.

Pesquisei sobre a Casa de Anne Frank, que é o museu criado no prédio e adjacências, de onde fica o então anexo secreto. Ingressos extremamente concorridos, e por um preço até razoável. Mas esgotados para o dia 3 de setembro. Eu entrei todos os dias no site para comprar os ingressos e voltei a ler o diário. Nem que fosse apenas para passar na porta do lugar e conhecer os lugares por onde Anne cresceu e viveu, eu queria fazer isso com o diário todo lido.

No dia 25 de agosto foram colocados novos ingressos para aquela data à venda. Eu mal pude acreditar! Tinha me informado que a alternativa seria ficar em uma fila em frente ao museu e aguardar o último horário para entrar sem hora marcada, correndo o risco de não haver entradas suficientes. E pelo que percebi quando lá cheguei, teria que passar praticamente todo o dia naquela fila por uma chance. A fila é bem grande e só vai crescendo ao decorrer do dia.

Aproveitei e comprei também ingressos antecipados para o museu de Van Gogh, esse sim eu poderia ter deixado pra comprar na hora, pois por conta dele tive que apressar o final da minha visita ao museu de Anne Frank. Meu relógio de pulso estava com o horário da Irlanda, que é 1 hora atrás do horário da Holanda, então cheguei na pequena fila de entrada para quem já tinha ingresso com mais de meia hora de atraso achando que estava adiantada. Me alertaram sobre o atraso, mas por sorte pude entrar.

Ter lido mais do diário fez toda a diferença. Melhor teria sido se tivesse lido tudo, mas não houve tempo. Deixo o relato sobre essa visita para outro momento. O que adianto é que tudo se torna muito mais real quando você se encontra, literalmente, entre as paredes daqueles cômodos apertados.

Andar pelas ruas de Amsterdã, que não mudou tanto desde aquela época, é quase uma viagem no tempo. Senti um clima de nostalgia sem precedentes. Era minha primeira vez por lá. Me distraí com a paisagem, quase fui atropelada diversas vezes por bicicletas (e senti imensa falta da minha bicicleta que ficou na Irlanda). De volta ao Brasil continuei a ler o diário. E percebi que nunca mais o leria como antes.


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